Em sua vida, o Senhor Krishna expressou o amor puro na forma mais elevada. Mostrou ao mundo que pode existir amor imaculado entre homem e mulher. É impossível descrever corretamente sua vida ímpar para o público em geral, pois ela transcendeu leis e padrões mundanos. Um dia, espero colocar no papel o verdadeiro significado da vida de Krishna, pois ela tem sido incompreendida e mal interpretada. Sua expressão de amor divino foi única no mundo.

Krishna teve muitas discípulas, mas Radha era a predileta. Cada discípula pensava: “Krishna me ama mais do que às outras”. Toda- via, como Krishna falava muito em Radha, as outras ficavam enciumadas. Percebendo isso, Krishna resolveu dar-lhes uma lição. Assim, certo dia, ele fingiu sentir uma terrível dor de cabeça. As discípulas, aflitas, demonstraram grande preocupação com o sofrimento do Mestre. Até que ele disse: “A dor só passará se uma de vocês ficar sobre minha cabeça e massageá-la com os pés”. Horrorizadas, as devotas exclamaram: “Não podemos fazer isto: tu és Deus, o Senhor do Universo. Seria o maior dos sacrilégios ousar profanar tua forma tocando com nossos pés tua cabeça sagrada.”

O Mestre fingiu que a dor aumentava; eis que Radha entra em cena. Correndo para seu Senhor, perguntou: “Que posso fazer por ti?” Krishna repetiu o pedido feito às outras devotas.
Imediatamente, Radha o atendeu: a “dor” do Mestre desapareceu e ele adormeceu. As outras discípulas, com raiva, arrastaram Radha para longe da forma adormecida.

“Vamos matá-la”, ameaçaram. “Mas por quê?”
“Como ousa pisar na cabeça do Mestre?”
“E daí?”, protestou Radha. “Isso não o livrou da dor?”
“Por ato tão sacrílego, você irá para as profundezas do inferno.” “Ah, é com isso que vocês se preocupam?”, disse Radha, sorrindo. “Com muita alegria eu viveria lá para sempre se isso o fizesse feliz por um segundo.”

Então todas se curvaram a Radha. Compreenderam por que Krishna a favorecia, pois só Radha esquecia de si mesma e pensava apenas no bem-estar do Mestre.

No entanto, por receber uma atenção especial, Radha começou a encher-se de orgulho. Assim, certo dia, o Senhor Krishna disse: “Vamos sair juntos, às escondidas”. Fazendo com que acreditasse que queria estar a sós com ela, Krishna brincou com a vaidade de Radha, que se sentiu muito feliz e favorecida. Percorreram uma boa distância, mas Krishna não parecia disposto a parar.

Finalmente Radha, exausta, sugeriu: “Aqui é um bom lugar para sentar um pouco”. Krishna olhou em volta, desinteressado, e disse: “Vamos procurar um lugar melhor”. E continuaram caminhando, caminhando… Por fim, já sem forças, Radha queixou-se: “Não aguento mais”. Krishna perguntou: “Muito bem, você quer que eu a carregue?” Isso agradou muito à vaidade de Radha. Mas, assim que ela pulou nas costas de Krishna – oh! – ele desapareceu, e ela caiu desajeitadamente.

Com o orgulho abalado, ajoelhou-se e humildemente pediu: “Amado Senhor, errei em querer possuí-lo e controlá-lo. Perdoe-me, por favor.” Krishna reapareceu e abençoou-a. Naquele dia, Radha aprendeu uma grande lição. Fora um grave erro ver o Mestre como homem comum, passível de ser seduzido e controlado por artimanhas femininas. Compreendeu que ele se interessava pela alma da discípula, e não por sua forma física.

Paramahansa Yogananda, Romance com Deus

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